quinta-feira, maio 09, 2013

Reflexões sobre a fé




“A fé é a mais elevada paixão de todos os homens.”

Søren Aabye Kierkegaard (1813 - 1855) filósofo e teólogo dinamarquês.

Rilda Freitas

Não há como fugir do elemento “fé”. À parte seu conceito relacionado à religião, num sentido epistemológico, a fé é simplesmente crença ou certeza. O autor da epístola aos Hebreus afirma isso de forma magistral ao afirmar “A fé é a certeza de coisas que se esperam, a convicção de fatos que se não veem.” (Hebreus 11:1) Quando falamos sobre fé, falamos sobre convicções. No sentido mais lato da palavra, o ateu também é uma pessoa de fé. Não podemos concluir que ele não tenha fé, que ele não acredite. Ao contrário: ele crê, está seguro, convicto que não existe algo ou Alguém além daquilo que ele possa ver e vivenciar. Ele crê que toda a existência é justamente fruto do acaso, ou de alguma consequência, ou de algum processo que não inclua um Ser Supremo. Esta convicção é a verdade para o ateu. Para o ateu, é impossível conceber que há um Deus, e que é pessoal, que se encarnou na humanidade para sempre, e que se deixou ser crucificado. A sua não-crença nas verdades cristãs é, em si mesma, uma crença.

Considerando sobre a dinâmica da fé, temos fé em Deus não porque O tenhamos procurado. Estávamos mortos. Morto não tem vontade própria. Ao contrário, foi Ele quem nos procurou primeiro, foi Ele quem nos chamou e, ao ouvir Sua potente voz, nos ressuscitou de nossa ausência de vida Nele. Nós O amamos porque Ele nos amou primeiro, se perseveramos Nele é porque Ele nos faz habitar em Cristo nos lugares celestiais, é Ele quem nos faz permanecer Nele mesmo. Tudo provém Dele, tudo depende Dele apenas. Ora, que isso tem a ver com a fé? Tudo! Pois se Ele é quem nos chama, nos vivifica, nos faz permanecer, então não há mérito algum para nós. Como foi Ele quem nos chamou, então foi Ele quem fez brotar a fé em nossas mentes. Por isso afirmo que não há como perder a fé, considerando que ela não depende de nós, mas do próprio Deus que a faz brotar na essência de nossa existência.

Um dos Cinco Pilares ou Pontos do Calvinismo é a doutrina da Perseverança dos Santos. O Catecismo Maior de Westminster, na pergunta 79 (Não poderão os crentes verdadeiros cair do estado de graça, em razão de suas imperfeições e das muitas tentações e pecados que os surpreendem?) tem a resposta clara e objetiva: “Os crentes verdadeiros, em razão do amor imutável de Deus e do Seu decreto e pacto de lhes dar a perseverança da união inseparável entre eles e Cristo, da contínua intercessão de Cristo por eles, e do Espírito e da semente de Deus permanecendo neles, nunca poderão total e finalmente, cair do estado da graça, mas são conservados pelo poder de Deus, mediante a fé para a salvação.” Ainda que o cristão verdadeiro peque, ele sabe que Deus é poderoso para atraí-lo a Si e perdoá-lo. Ainda que o cristão verdadeiro se afaste de Deus a tal ponto de lambuzar-se no pecado e “desejar comer das bolotas para os porcos” ele sabe que Deus é poderoso para limpá-lo e recolocá-lo na condição de filho, santificado em Cristo. Ainda que o cristão verdadeiro O negue momentaneamente através de suas ações, ele sabe que Deus é, e é poderoso para restaurar-lhe a vida. O cristão verdadeiro, que nasceu verdadeiramente da ação do Espírito Santo de Deus, sabe que o seu chamado é fruto “irrevogável” do próprio Deus que um dia não somente brotou em seu coração, mas fundiu-se em seu ser.

Essa fé que provém do próprio Deus fez com que Policarpo, bispo de Esmirna, aos oitenta e seis anos de idade, não negasse ao seu Redentor e Deus, preferindo o martírio a ascender incenso ao imperador romano: “Por oitenta e seis anos, eu O servi. Como então posso ter blasfemado contra meu Rei e Salvador?” Essa mesma fé que é sustentada por Deus fez com que Inácio de Antioquia aceitasse ser “moído como trigo pelas feras” “Meu novo nascimento está próximo. Perdoem-me irmãos, não me impeçam de viver. Deixem-me chegar à luz puríssima.” Jan Hus também não hesitou ser queimado vivo e tinha a convicção que "Vocês hoje estão queimando um ganso, mas dentro de um século, encontrar-se-ão com um cisne. E este cisne vocês não poderão queimar." (Provavelmente, referindo-se a Lutero). A lista é infindável. Se pegarmos a lista dos homens e mulheres, tanto católicos como protestantes, que, firmes em sua fé proveniente de um encontro pessoal com Deus, preferiram o enfrentar o inimigo maior que nos aflige e atemoriza, não chegaremos tão cedo ao fim. E essa lista começou lá em Gênesis, nos primórdios da humanidade. Essa é a elevada – e sublime – paixão da qual Kierkegaard compreendeu. Paixão que nos faz desejar morrer do que perdê-la, paixão que nos faz negar-nos a nós mesmos, tomar nossa cruz e segui a Cristo não importando por quais caminhos Ele quer que sigamos. A vida sem fé é desprovida de significado.

Percebemos, assim, que a fé é algo indissociável do ser. Negá-la é o mesmo que negar-se, ou não se crê que existe? A fé está enraizada na alma. Perde-se a fé nas instituições, nos métodos, nas pessoas, mas um verdadeiro cristão jamais perde a fé Nele, pois ela provém Dele. Se alguém que se diz ser cristão não entende isso, deverá parar e refletir se realmente um dia encontrou-se com o Salvador. Se um dia foi chamado da morte para a vida. Essa é a pergunta mais importante que o ser humano deve fazer a si mesmo. 

Concluo com as sábias palavras do Mestre: “A tua fé te salvou; vai-te em paz.” Lucas 7:50

Rilda Freitas é colaboradora e moderadora do Genizah

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